Os Aspectos Biológicos da Dependência Química

Aspectos biológicos da dependência química


 1- A tomada de decisões – a dependência química como uma patologia da vontade (o cérebro em constante conflito)

Se formos tentar resumir em uma única frase a grande dificuldade de um indivíduo portador da síndrome da dependência de SPAs (Síndrome de Dependência a Substâncias Psicoativas), podemos dizer que está na sua dificuldade de fazer escolhas na vida. Por trás disso existe todo um substrato neurobiológico que explica a etiologia da dependência de SPA, isto é porque certos indivíduos são mais vulneráveis do que outros para desenvolverem a dependência após suas primeiras experiências.
A importância dessa compreensão traz subsídios fundamentais para futuras intervenções no tratamento.
A interação entre o indivíduo e o seu meio resulta de um constante processo de tomada de decisões. O fluxo contínuo de estímulos que recebemos tanto do ambiente quanto do nosso organismo, nos leva a nos posicionarmos acerca do que é prazeroso e do que é adequado de acordo com a inserção social.


O cérebro humano, resultado da evolução de milhões de anos, está equipado tanto para sinalizar a nossa “vontade” do prazer imediato, quanto para modular essa vontade de maneira que essa vontade não possa prejudica-lo num contexto social mais amplo.


Aí está o CONFLITO, e quando ocorre alguma distorção dessa flexibilidade denominamos de patologia da vontade. A Síndrome da dependência de SPA nada mais é do ponto de vista neurobiológico, que uma patologia da vontade onde o poder de modulação cerebral de tomada de decisões está profundamente alterado.



2) A dificuldade de fazer escolhas

Sempre que uma situação exige uma tomada de decisão é porque há uma possibilidade de escolha. O dilema é qual escolha é mais vantajosa? As sociedades têm criado estruturas para restringir possibilidades de tomadas de decisões e escolhas. Por exemplo, estruturas religiosas, pela fé, e militares, pela obediência cega à hierarquia, são exemplos de contextos sociais nos quais os indivíduos acostumam-se a aceitar uma linha de pensamento / comportamento que vai reduzindo o CONFLITO anteriormente descrito, pois essas instituições trabalham com o fortalecimento extremo de decisões ou escolhas ponderadas, buscando sempre recompensas no futuro.
Portanto quando falamos do processo de tomada de decisões é inevitável não falarmos da variável tempo, de tal forma que toda escolha vai ter como resultado uma consequência num primeiro momento, mais imediata, e outra num segundo momento, num futuro mais longínquo.

Os moduladores da escolha são:

► A questão moral de cada um
► O estado de espírito (emocional)
► O conjunto de necessidades do momento
► Experiências passadas em situações semelhantes


O dependente químico como veremos no tópico a seguir, tem uma dificuldade patente de fazer escolhas pautadas em recompensa no futuro, preferindo sempre o “prazer imediato”.


3) As tomadas de decisões e áreas cerebrais responsáveis x dependência química


É importante primeiro saber que nosso cérebro está “equipado” com estruturas que apoiam tanto a decisão imediatista (instintivas) quanto a mais ponderadas.
As estruturas que são responsáveis pela contemporização / ponderação dos instintos estão situadas nas regiões anteriores do cérebro, também chamadas de pré-frontais, e se opõem às estruturas volitivas (ligadas aos desejos básicos, mas também ao uso de SPA) que é sub-cortical. Este circuito, ligado à busca do prazer, modulado pelo córtex pré frontal, denomina-se SISTEMA CEREBRAL DE RECOMPENSA.  Como vimos, com seus 2 polos: um sub-cortical , com estruturas ligadas a busca de prazer/ vontade/ e emoções ( sistema límbico) e outro cortical ( pré –frontal ) que se opõem e modula e pondera essas “vontades”.


Daí o paradigma da dependência química, o que estaria alterado nesse processo de tomada de decisões? O porquê dizer uma patologia da vontade?


Em primeiro lugar, é necessário dizer que esse sistema anteriormente descrito ( CEREBRAL DE RECOMPENSA) que se ramifica para as áreas corticais pré frontal e subcorticais (sistema mesolímbico), são de neurotransmissor dopaminérgica, serotoninérgica e norardrenérgica.


Vários estudos da literatura científica, demonstram que em relação a dopamina, indivíduos dependentes químicos possuem um número de receptores (principalmente o receptor D2) para esse neurotransmissor reduzido a nível cerebral em relação a população geral. Isso ajudaria a entender o porquê quando o indivíduo dependente usa uma SPA e é liberada uma quantidade enorme de dopamina na fenda sináptica do neurônio, nesse indivíduo pela número diminuído de receptores para ela (dopamina) se ligar, ele não sente prazer que o usuário não-dependente consegue atingir com poucas doses.


Outro dado significativo e altamente documentado na literatura científica é que com o uso crônico da dependência de álcool e outras SPA, uma das áreas mais comprometidas é o lobo frontal, que como já vimos, é responsável pela FUNÇÃO EXECUTIVA, ou seja, tomada de decisões, resolução de problemas, e não agir somente com os instintos e vontades. Quando realizamos estudos de imagem percebemos comprometimento patente nessa área cerebral, ou com perda neuronal ou com perda da ramificação dos neurônios o que também significa disfunção.
Nesse sentido impulsividade, passa a ser um sintoma frequente nas fases de abstinência da maioria dos portadores de Síndrome de dependência de SPA crônicos, necessitando muitas vezes de intervenção psiquiátrica medicamentosa, e principalmente de técnicas comportamentais, visto que inicialmente a sua cognição está comprometida.


4) ASPECTOS CLÍNICOS E PSIQUIÁTRICOS DA DEPENDÊNCIA QUÍMICA

Por que quando for se tratar de um indivíduo portador da Síndrome de dependência SPAs deve obrigatoriamente se proceder à avaliações clínicas e psiquiátricas regulares e intensivas principalmente no 1º mês de tratamento?

Porque a presença de doenças clínicas e psiquiátricas associadas ao consumo de álcool, tabaco e outras drogas é um fenômeno comum e cientificamente bem documentado.


As taxas de doença mental grave (esquizofrenia, transtorno afetivo bipolar, depressão maior) e transtornos relacionados ao uso de SPA são extremamente alto em adultos, de modo geral e, torno de 50% ou mais dos casos (Drake, 2007).
Em outras palavras, a cada 2 pacientes que buscam atendimento por uso problemático de SPA, 1 deles apresentará um transtorno mental correlacionado.
No entanto, esse diagnóstico muitas vezes, não se estabelece num primeiro atendimento, devido a interferência dos sintomas da Síndrome de abstinência que podem mimetizar os próprios comemorativos psicopatológicos do transtorno mental. Portanto o diagnóstico da comorbidades psiquiátrica muitas vezes é realizado ao longo de um continuum seguimento pelo psiquiatra especialista seja a nível ambulatorial, hospital-dia ou internação em clínica especializadade acordo com a gravidade da dependência.


Por fim , um amplo espectro de patologias clínicas podem ocorrer em indivíduos portadores de Síndrome de dependência de SPA, entre elas, destacam-se , o comprometimento hepático (cirrose, hepatites, etc.), cardíaco (hipertensão arterial, miocardites, etc), renal, pancreático, cerebral ( neurites, demências, AVCs, infecções, etc ) , além das infecções em geral , como pneumonias, hepatites virais B e C , infecção pelo HIV/AIDS, etc... essas fazendo parte de um contexto de exposição a atividades comportamentais de risco que predispõe às infecções.
É necessário portanto que o tratamento também ofereça suporte especializado para, não só tratar essas patologia, mas para também, educar e prevenir a ocorrência delas em indivíduos não afetados.


5) O TRATAMENTO PSICOSSOCIAL DA DEPENDÊNCIA QUÍMICA

Como já vimos a origem da Síndrome da dependência química é multifatorial (biológica , psicossocial , familiar e ambiental e espiritual) .
Os aspectos biológicos foram abordados anteriormente, quando tratamos da neurobiologia da tomada de decisões, do papel da dopamina e seus receptores e dos transtornos psiquiátricos ( que podem contribuir para o desenvolvimento da dependência química primariamente) .


Além disso outros fatores de VULNERABILIDADE somam-se ao fator biológico e concorrem para tornar o indivíduo em algum momento de seu curso de consumo “pronto “pra desenvolver sua dependência entre esses fatores estão :


Fatores ligados a própria característica da SPA (de modo que determinadas SPAs são potencialmente mais causadoras de dependência que outras por mecanismos farmacodinâmicos ou farmacocinéticos);


Fatores ambientais (permissividade e estímulo, propaganda, políticas de regulamentação do consumo, escola- pressão do grupo-colegas, atividades da vida diária, laços e vínculos, atividades em grupo, normas de convívio); 


Fatores sociais (violência, moradia, estabilidade social, laser, cidadania, oportunidades, escola – pressão- bullying- constrangimento- laços-vínculos-oferta-SPA);


Fatores familiares e psicológicos – aqui reside um grande fator de vulnerabilidade para o desenvolvimento da Síndrome de dependência de SPA. Há relatos evidentes na literatura científica apontando para o não amadurecimento emocional dos indivíduos provavelmente associado ao desenvolvimento de CRENÇAS CENTRAIS DISFUNCIONAIS na infância, levando por consequência a um padrão de PENSAMENTOS AUTOMÁTICOS DISFUNCIONAIS E SENTIMENTOS IMATUROS / IMPULSIVOS. Obviamente que CRENÇAS CENTRAIS NA DEPENDENCIA QUÍMICA (DESAMOR, ABANDONO, DESVALOR, REJEIÇÃO) são geralmente construídas num contexto de famílias disfuncionais. Há relatos na literatura de rigidez excessiva, violência intradomiciliar, e ausência paterna.


Fatores espirituais - uma das maiores dificuldades do portador da Síndrome de dependência de SPA, referida anteriormente no capítulo dos sinais e sintomas, é o total ISOLAMENTO, onde o mesmo não consegue enxergar mais nada no universo além de si mesmo e o mundo do uso. Perde o referencial de espiritualidade no sentido de ver o OUTRO EM SUA VIDA. Essa reconstrução é muito bem feita em GRUPOS DE AJUDA MUTUA (AA E NA) onde pela empatia, ele recomeça a ver sentido do ALTRUISMO, ferramenta tão mais importante quanto qualquer medicamento prescrito por um médico.


Feito esse BREVE introdutório ETIOPATOGÊNICO, resta-nos responder a seguinte questão como tratar de patologia tão complexa?

A pergunta é simples: de maneira MULTIFACETADA E ESPECIALIZADA. Para isso os 13 princípios de tratamento proposto pelo National Institute of Drug Abuse (NIDA) do National Institute of Health (NIH) dos EUAé um bom guia de referência. Nós seguimos esse referencial.


Não há como tratar de um indivíduo portador de Síndrome de dependência de SPA em regime de internação em síndrome de abstinência aguda, com transtornos mentais e clínicos em associação sem a presença regular de um psiquiatra especializado em dependência química, enfermeiro padrão e equipe de enfermagem 24 horas.


Não há como tratar de um indivíduo portador de Síndrome de dependência de SPA em regime de internação integral, hospital dia ou ambulatorial e não oferecer um tratamento que inclua abordagem psicossocial –familiar –ambiental-espiritual.



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A Clínica de Recuperação CTES tem como missão recuperar, reestruturar e reabilitar a vida de dependentes químicos e alcoólatras, promover o bem estar físico, psíquico, espiritual do paciente, bem como sua Reinserção ao seio familiar, social e profissional através de atenção de equipe multidisciplinar que desenvolve em conjunto um tratamento especifico e individualizado para atender a necessidade de cada paciente.

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